quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Palheta ou Dedo - E agora!?

Respeitável público,




Hoje tentarei abordar um tema por várias vezes discutido entre diversos guitarristas. Esse talvez seja um dos assuntos mais polêmicos entre guitarristas em uma determinada época da vida. Assim como todo mundo passa pela adolescência, todo guitarrista tenta provar que a palheta é melhor que o dedo e/ou vice-versa.



Mas e então? Dedo ou Palheta? E agora!?
Bom, a resposta rápida é: - Os dois!

 
Mas eu quero escolher o estilo principal!
Então, vamos à luta!



Se você gosta do Mark Knopfler e seu amigo gosta do Sueco Fritador, provavelmente vocês já tentaram colocar na mesa de discussão que 'tocar de dedo' é melhor que 'tocar de palheta'. Nesse momento, você pega sua guitarra e faz uma frase cheia de saltos de corda e double-stops. Na outra ponta, seu amiguinho pega sua Dunlop Jazz-III e faz uma frase de 3 notas por corda, todas palhetadas, linda de morrer e muito bem executada.

Nessa brincadeira, passa o dia e ninguém chegou a lugar algum.


Na minha opinião, todas tem seus benefícios, mas cabe ao guitarrista fazer da sua técnica favorita seu meio de expressão.



Bom, chega de mimimi e vamos aos pontos.



Timbre.

Esse talvez seja o principal fator que faz com que alguns guitarristas optem pelo uso dos dedos ao invés da palheta. De início a gente não percebe, mas, com o tempo e o amadurecimento da percepção do timbre, o som proveniente dos dedos é nitidamente mais cheio e gordo do que a palheta.

E nem sou eu quem fala.
Quem afirma isso é o 'Cabra' do vídeo abaixo. (1m32s do vídeo)


No vídeo, o pequeno Scott (esse tem futuro) fala do uso da palheta e do dedo. É facilmente perceptível a mudança do timbre quando ele usa a ponta da palheta, a borda da palheta e o dedo.



Outro menino que aborda esse tema é o desconhecido Robben Ford (olho nele). No vídeo abaixo, o próprio Robben faz uma breve análise sobre as duas técnicas.

Nesse vídeo, Robben foi direto ao ponto.
Palheta para velocidade e 'dedos' para o Blues.

No decorrer do vídeo, ele faz uma pequena demonstração da diferença entre as técnicas.
Uma das coisas mais importantes, na minha opinião a mais importante, é o "pop" ou "slap" das cordas com o uso dos dedos. A dinâmica das notas reflete, ao meu ver, toda a intensidade e emoção de uma frase. (0m50s do vídeo)

Lógico que ele poderia ter feito essa frase com a palheta, e provavelmente sairia muito parecido com o original tocado com os dedos. Mas a opção pelos dedos traz, não sei se é só eu que ouço, um "micro silêncio" entre as notas que faz toda a diferença.

Bem, aí ele entra com a palheta e a coisa toda muda de figura.

Com a palheta, a nota fica amplificada e definida. A definição, nesse caso, é causada pelo contato da palheta com a corda. O 'tic' define o ataque da nota e a dureza/material da palheta irão definir o volume dessa nota.
Tocar com a palheta também pode ser bluesy (Jimi que o diga), e traz um destaque ao guitarrista em termos de volume e agressividade.


Ah, mas eu gosto de metal e não dá pra fazer os arpeggios sem a palheta.

Quem disse?


Esse maluco aí fritou tudo. Claro que esse moço usou uma super técnica de violão clássico e, com o uso das unhas, o cara parece que toca com 3 palhetas. 

Claro que aí ele está usando cordas baixinhas, tensão leve, um abafador e fatalmente um compressor. Mas isso quase todo metaleiro usa.

Se o 'Jovem Shreder' quer um pouco mais de força em um fraseado como esse, a palheta é, na minha opinião, a escolha ideal, pois ela poderá adicionar mais dinâmica ás notas. Mas está aí a prova de que não é preciso palheta pra executar essas coisas.


Acho que por esses 3 vídeos, dá pra perceber que, quando o timbre do instrumento se sobressai sobre a distorção, o timbre dos dedos é mais aveludado/encorpado do que com a palheta. Isso logicamente acontece devido ao contato da carne com as cordas.




Técnica de mão direita (no caso dos destros).


Dependendo da sua técnica da mão esquerda... sim, esquerda, ela pode influenciar diretamente em como sua mão direita irá atacar as cordas. Se você gosta de tocar 'super harmonias' no estilo Ted Greene, não usar a palheta é quase uma obrigação, mas se você curte um estilo Holdsworth de ser, pode ser que a palheta ajude.

No caso da técnica de legato, como a maioria das notas se pronunciarão por execução apenas da mão esquerda, na minha opinião, 'de dedo' ou 'de palheta' não irão fazer a menor diferença.

Allan Holdsworth usa palheta na maioria do tempo, já o Allen Hinds usa os dedos em quase todo o show.

Se você tem uma pegada mais forte como a do Malmsteen ou do Joe Satriani, a palhetada traz o ataque e a presença necessárias ao estilo que irão ajudar, e muito, naqueles vibratos brutais à là Zakk Wylde.

Caras como Clapton, Eric Johnson, Joe Bonamassa (o Pizzaiolo) e SRV estão ligados diretamente com a palheta. Clapton, de vez em quando larga a maldita, mas é por uma ou duas músicas. Já o BB King nunca largou a palheta e, com certeza aquele 'twing' e vibratos dele jamais sairiam daquele jeito sem a bendita pontiaguda.

Um detalhe que alguns guitarristas observam é, que com o uso da palheta, existe um choque de volumes muito grandes entre o contato dela com a corda, isto é, no exato instante que a nota começa a se pronunciar e o restante (sustain) dela.
Tentando descrever isso, é como se fosse um assim: -PEeeeeeemmmm.

Não confundir com o efeito 'Tuleum'


Pra evitar esse tipo de 'choque', guitarristas como Jack Pearson, palhetam suavemente as cordas, causando uma uniformidade durante a vida daquela nota


A turma que curte um Jazz tradicional, chord medody e aquele fraseado de oitavas, geralmente apela e acaba por usar somente o polegar para tocar. Pois o polegar não traz o 'raspar' da palheta

Dizem que a 'pegada de polegar' começou quando o Wes Montgomery, então estudante de guitarra, ouvia muitas reclamações dos vizinhos porque, quando ele praticava, o volume era muito alto. Então, pra não deixar de praticar, ele passou a usar o polegar de forma suave ao invés da palheta para seus estudos. Depois disso, o resto é história.

E que história


Tudo no polegar! impressionante.


Outro cara que já fez de tudo é o Jeff Beck. O cara toca de palheta, dedo e polegar (que também é dedo, mas eu vou considerar como um joanete). Jeff sabe quais as técnicas ideais para cada tipo de música. Claro que ele raramente usa palheta, mas quando usa, faz com maestria. No caso dele, tudo que ele pôde adaptar para o fingerstyle, ele adaptou

Jeff já declarou que gosta mesmo é do timbre extraído pelo polegar. Certa vez, Jeff estava fazendo manutenção nos seus Hot Rods e sofreu um acidente que quase decepa seu polegar da mão direita. Depois da recuperação ele confessou que ficou com medo de não poder usar mais o polegar devidamente, pois descobrira que 'Its all about the thumb'.

Mas quem nunca ouviu ele destruindo de palheta?

Pois é...

 

Junto desse bolo todo, teve um cara que passou meio desapercebido perante essa turma toda. Esse cara é um tal de Mark Knopfler. Esse cara talvez seja, mesmo não sendo o pioneiro, a maior referência de fingerstyle na guitarra elétrica até hoje
Todo mundo que vê um cara tocando sem palheta diz: - Olha aí o cara tocando feito o 'Dari Strit'!

Não dá pra imaginar Sultans os Swing tocado de palheta. Até que sai, mas não é a mesma coisa.

Já postei isso aqui.
Mas está aí o homem falando a mesma coisa dos outros.

Todos dizem a mesma coisa. Palheta é para velocidade.


Uma das coisas que faz com que alguns guitarristas troquem a palheta pelos dedos é apenas o conforto. Alguns, como eu, não se sentem à vontade segurando a palheta ou até mesmo seguram de uma maneira desconfortável causando cansaço ou desconforto ao longo de um show.

No caso do senhorzinho aí em cima, tudo começou por conforto. Certo dia ele estava dedilhando um violão e percebeu que tudo que ele fazia com a palheta, ele fazia com os dedos. Então, por naturalidade, ficaram os dedos.

E olha que o ídolo maior dele é o Hank Marvin, um palheteiro de primeira.

Percebe-se então, que o fato de eu gostar de Steve Morse não significa que tenho que usar palheta. Também é justo dizer que mesmo o Mark Knopfler sendo para alguns o guitarrista mais sentimental de todos, esses, não necessariamente precisam largar a bendita palheta.


Até agora, só fiz escrever de um e de outro. Estou parecendo um moleque que acha que acha que técnica de guitarra é igual ao Highlander.

Então porque não unir o útil ao agradável e misturar as duas técnicas assim como fez Chet Atkins, Josh Smith, Vince Gill, Albert Lee, Danny Gatton e todos aqueles que gostam de música caipira?


Pois não é que parece bom!


Pois é, essa técnica visualmente feiosa é conhecida como 'Chicken Picking'. Isso porque, eu acho, que é porque o desenho da mão da palheta parece uma galinha quando a gente brinca de fazer sombra na parede.




Sério! Vê se não parece?

Essa técnica consiste de duas formas. 
Uma com palheta comum e a outra com a famosa, e não muito utilizada por guitarristas, Dedeira (palheta de polegar).

Não é Mamadeira, ok?


Aí já entramos em mundo de alienígenas. Porque esses caras conseguem extrair o melhor de 2 mundos, isto é, conseguem palhetar com velocidade e força, fazer double stops, saltos de cordas, frases caipirescas... enfim, tudo!

Particularmente, eu detesto a palheta de polegar, pois parece que o dedo fica com 10Kgs. Mas, por outro lado, deixa os outros dedos livres.

Outra coisa que não gosto de usar a dedeira, é que timbre extraído pelo polegar vai ser sempre 'palhetizado', e pra mim, o polegar é parte importantíssima para um timbre gordo e ritmos meio abafados. 

Eu mesmo, cansei de ouvir o Just One Night do Clapton e ficar avançando as músicas pra chegar na parte do Albert Lee. A pegada de Chicken Picking dele naquele disco é impressionante.


Me lembro também de ouvir a fase menos pesada do Brett Garsed e fiquei doido querendo saber como ele fazia toda aquele fraseado rock/fusion e no meio daquela coisa toda ele metia um slap que eu tentava adivinhar de onde vinha. A resposta: Chicken Picking.


Tenho que verificar o registro dele no MIB. (3:30 do vídeo)

É!

Próximo tópico...



Tipos de palheta



Para os que optam pelo uso da palheta, ou até para aqueles que, assim como eu, tentam criar uma relação com ela, o tipo da palheta influencia, e muito, no timbre desejado.

Mas isso é meio óbvio, pois existem vários tipos de palhetas feitas com diversos tipos de materiais.
Sendo assim, cada material trará um timbre diferente ao instrumento, além disso, como mostrado pelo Scott, dá pra tirar dois tipos de timbre com uma só palheta.


Existem palhetas de diversos tamanhos. Redondas, pequenas, grandes, triangulares (Carlos Santana), grossas, finas, pontiagudas, arredondadas... Assim como podem ser feitas de diversos materiais como o plástico, madeira, osso, vidro, metal, carbono e materiais sintéticos porosos ou lisos.


Uma ideia da diferença entre palhetas de materiais diferentes


Se você não entende porque aquela palheta que vem junto do encordoamento que você usa uma porcaria. 
Não entenda. Ela é ruim mesmo. Tão ruim que desmotiva.

Existem palhetas para todos os gostos, mas generalizando um pouco, vou tentar associar algumas coisas com palhetas.

Pra tocar o Blues, palhetas Fender Heavy, pra mim são as melhores, pois elas tendem a criar dentes nas bordas e fazem o som ficar raivoso. Danny Gatton arranhava suas palhetas Fender nos knobs da Telecaster. Joe Satriani também prefere as palhetas Fender usadas, pois ele gosta do "arranhado" que os dentes da palheta fazem.

Para metaleiros perfeccionistas, palhetas porosas de 2mm ou mais. Alguns metaleiros atuais costumam usar palhetas de vidro ou de metal. Ambas, de preferência, pequenas.

David Gilmour agora palhetas Gibson Tear Drop.

Jazzistas preferem as famosas Jazz III. Porem, Pat Metheny usa palhetas comuns extremamente finas e moles.

Para aqueles que não tem afinidade com o fingerstyle mas querem o som gordo dos dedos, palhetas de madeira são as mais indicadas.




Prós e Contras


Sei que não sou o mais indicado pra falar, pois sou mais adepto ao uso dos dedos, mas vou tentar esclarecer um pouco do que eu acredito ser benéfico, ou não, entre palhetas e dedos.

Bom, pra mim não existe esse negócio de 'prós e contras'. Tudo é questão de preferência.

Claro que coisas como execuções de 3 notas por corda, sweeps, rakes, harmônicos articificiais, etc... são mais fáceis fazer com palheta.
Da mesma forma que saltos de cordas, timbres aveludados, slaps, double stops e ghost notes são mais tranquilas de fazer com os dedos.



Ah, mas tem um que é melhor que o outro?


Não necessariamente. É realmente uma questão de conforto e identificação com o estilo. Tudo é possível de fazer usando os dedos e palhetas. Cabe o bom senso do guitarrista na hora de tocar.


Muitos professores de guitarra usam apenas a palheta e querem que seus alunos a usem também devido a facilidade dele, o professor, passar os exercícios e aplicações.
Como a maioria dos guitarristas usa palheta, existem boas técnicas de palhetada. Caras como o Frank Gambale e John Petrucci são exímios palheteiros, mas cabe ao estudante que prefira os dedos tentar adaptar as técnicas de palheta para o fingerstyle.



Escreveu tanto e não disse nada!


Também não é por aí. 
Copiar as coisas de outros guitarristas faz parte do processo de ser músico. Um escritor lê muito antes de escrever seu primeiro livro.

Mas, ser músico, no caso, guitarrista, é fazer música com uma assinatura própria. Tocando lento ou rápido, som cru ou processado, o que vale é ser reconhecido pelo seu som, seu timbre, seja tocando cover ou autoral.

O negócio é não ter preconceitos e procurar ter o máximo de autenticidade no seu som. De palheta ou de dedo, o que importa não é como você toca, mas sim se o que sai dos seus dedos é de verdadeiro.






Quero deixar como coautor desse post o Guilherme Dantas. Ele quem me sugeriu para que eu escrevesse sobre esse assunto. Muita coisa que está aqui no post, foi fruto de um bate-papo no post anterior.



Abraço!